Soberania

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Até 2001, Torneio Rio-São Paulo era sinônimo de frustração para os são-paulinos. Em 21 participações, o máximo posto obtido havia sido o 2º lugar em quatro ocasiões. Mais do que o baixo desempenho - explicado pela competição ter existido, basicamente, durante o período de construção do Morumbi - tudo parecia acompanhado por altas doses de azar.
Depois ser reativado em 1997, o RJ-SP viu o Tricolor ser vice em 1998 e cair nas semifinais em 1999 e 2000. O São Paulo não andava muito bem das pernas - seus melhores jogadores haviam sido vendidos ao exterior para sanar as contas adquiridas pela reforma de seu estádio.
A solução foi apostar, novamente, nas jovens promessas que, um ano antes, conquistaram a Copa São Paulo de Juniores. Dentre os meninos tricolores estava Cacá - sim, Cacá com "c". A jovem promessa (lapidada desde a infância como uma jóia rara), contudo, sofrera uma fratura de vértebra em um acidente e, recuperando-se, nem era cogitado como salvador da pátria...
Na primeira fase, a irregularidade deu o tom. Classificando-se em segundo no grupo paulista, enfrentaria o Fluminense, então campeão invicto do grupo carioca. No Morumbi, vitória simples (gol de França). O segundo jogo foi dramático. Ao fim da partida, 2 a 1 para o Flu. Decisão por pênaltis!
Rogério Ceni, que já fizera uma de suas melhores partidas com a camisa do SPFC no tempo normal, se consagraria na marca da cal naquelas cobranças. Três chutes defendidos e 7 a 6 no placar final para o São Paulo!
A final seria contra o time da Estrela Solitária, mas o SPFC jogaria desfalcado: Rogério fora convocado para a Seleção. No Maracanã, o Tricolor só emplacou no 2º tempo, quando Luís Fabiano, duas vezes, Carlos Miguel e França definiram o jogo: 4 a 1.
Na volta, 7 de março, 71668 pessoas em um Morumbi eufórico viram a explosão de uma supernova. Ou seja, o nascimento de uma estrela. A partida corria equilibrada. Temiam que o SPFC se complicasse por excesso de confiança. E o temor era justificado: os alvinegros abriram o placar.
"Seria o azar novamente"? Segundo tempo, 15': um garoto com o número 30 às costas entra em campo, sem chamar lá grande atenção. Vinte minutos depois, o franzino rapaz recebe a bola, dribla o adversário e chuta na saída do goleiro. Gol de empate! O primeiro gol de Cacá - futuramente Kaká - com a camisa do São Paulo. Não bastava para a consagração. Veio então o segundo, poucos minutos depois, e o grito de "Campeão!" enfim desentalava-se da garganta do torcedor tricolor.
São Paulo Futebol Clube, Campeão do Torneio Rio-São Paulo de 2001.
Agora sim a competição poderia se extinguir de vez. E isto não tardou a acontecer...
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"O São Paulo é Brasil na Libertadores, amigo". Esse tradicional bordão do futebol foi consagrado justamente em jogos do Tricolor durante os anos de 1992, 93 e 94. A competição se enraizou de tal jeito na alma do são-paulino que padecer 10 anos sem disputá-la foi um verdadeiro martírio.
Da mesma forma que despertou nos demais o mesmo anseio de possuí-la. Anseio este perdido, esquecido, relegado, até o São Paulo resgatá-lo.
Herança de Telê, a relação do SPFC com a Taça supera a questão de identidade. É maior. Carteira de identidade qualquer um pode ter. A questão é o passaporte internacional. Carimbos em suas folhas, de Buenos Aires, Montevidéu, Lima, Santiago, são como títulos de primeira grandeza.
Após tropeços consecutivos entre 2000 e 2002, o São Paulo, com a 3ª colocação obtida no Campeonato Brasileiro de 2003 - o primeiro da história realizado no sistema de pontos corridos - enfim reconquista o direito de disputar a Taça Libertadores da América, em 2004.
Provando ter um gosto todo especial por ela, a média de público da torcida são-paulina em jogos no Morumbi foi superior a 56 mil pessoas. Motivado e com um elenco razoável, o Tricolor chegou às semifinais, sendo eliminado no último minuto pelo Once Caldas, da Colômbia, futuro campeão.
Deixou água na boca. O Tricolor não se contentou. Ao fim do Brasileirão de 2004, novo 3º lugar e vaga mais uma vez garantida na competição internacional. Agora era preciso ser campeão!
Ao mesmo tempo em que inaugurava o Centro de Formação de Atletas Laudo Natel, para a revelação de novos craques, o SPFC trouxe nomes experientes, como Mineiro e Josué, volantes, e o centroavante Luizão.
O time engrenou. Liderou o Paulistão invicto por 15 rodadas, perdendo a invencibilidade para a Lusa. O título veio a seguir, contra o Santos (0x0), com três rodadas de antecipação. Surpreendentemente, e em um momento crucial, o técnico Émerson Leão deixou a equipe, indo trabalhar no Japão.
A equipe são-paulina já havia realizado quatro partidas na primeira fase da Libertadores (2 vitórias, 2 empates). O auxiliar Milton Cruz comandou a equipe na 5ª (empate fora de casa contra o Universidad de Chile). Seria necessário um nome de peso para levar o Tricolor ao título.
Ele veio, e chegou com absoluta moral. Logo de cara, no Pacaembu, 5x1 no pobre Corinthians, que não tinha nada a ver com a história (afinal, falamos de Libertadores, né?). Paulo Autuori levaria o São Paulo a avançar a passos largos para a conquista de seu tricampeonato sulamericano.
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Na fase decisiva da Taça Libertadores da América de 2005 (o popular "mata-mata"), o São Paulo desbancou um tradicional freguês no torneio. O Palmeiras caiu frente ao Tricolor com duas derrotas (1x0 no Palestra Itália e 2x0 no Morumbi - Cicinho mandou lembranças! Duas, aliás).
Nas quartas-de-final, em casa, partida sensacional do capitão Rogério Ceni (dois gols marcados e ainda um pênalti perdido), 4x0 no Tigres, do México. O jogo de volta seria a passeio, mas custou a invencibilidade no torneio. A semifinal, contudo, contra o River Plate, pararia toda a América Latina.
Sabendo das dificuldades, o São Paulo investiu um pouco mais. Trouxe o goleador Amoroso. O que o Tricolor desconhecia era um esquema envolvendo o árbitro do jogo para favorecer a equipe portenha. De nada adiantou, com seu novo atacante o SPFC faturou: 2x0 em casa ("El Morumbi te mata"), e 3x2 fora. Rumo à 5ª final de Libertadores na história!
As pelejas, contra o Atlético Paranaense, foram no Beira-Rio - o CAP à época ainda não possuía um estádio que se encaixasse nas exigências do regulamento para a final do torneio internacional - e no Morumbi. No jogo de ida, empate em 1x1. A consagração se daria no Morumtri !
71.986 pessoas presenciaram mais um show no Templo. Não o de alguma banda famosa, mas do "Time de Guerreiros", como ficou conhecida a equipe Tricampeã da Libertadores da América, após os sonoros 4x0. Rogério Ceni ergue a Taça e a torcida incendeia aos gritos de "Telê, Telê"!
Primeiro e único clube no Brasil a conquistar a América três vezes, o SPFC alçou nova meta: a Reconquista do Mundo. A FIFA, à frente da organização do Mundial, o reformulara. Agora com campeões de todos os continentes, o torneio teria a honra de contar com o Tricolor em sua inauguração.
Após fases eliminatórias entre confederações menores, os são-paulinos estrearam na fase semifinal do torneio contra o Al-Ittihad, da Arábia Saudita. Em jogo difícil, mas sob controle, o Tricolor venceu por 3x2 (2 gols de Amoroso, 1 de Rogério Ceni). Restava, na final, o Liverpool.
O time inglês, apontado como favorito, vinha de uma longa seqüência invicta e sem sofrer gols. Não foi o bastante para intimidar o 'Time de Guerreiros'. Os Reds não contavam com o lançamento de Fabão, o domínio e o passe de Aloísio (recém contratado), e o gol de Mineiro! Contavam menos ainda com o Capitão são-paulino, por quem, naquele dia, não passou nem pensamento.
E, assim, Yokohama, no Japão, viu, em 18 de dezembro de 2005, um título mundial ser decidido à maneira de um verdadeiro Clube da Fé, que perpetuou a lenda Rogério Ceni (escolhido o melhor jogador do jogo e do campeonato) e fincou a bandeira do São Paulo novamente no ponto mais alto do mundo!
Rogério, Fabão, Lugano, Edcarlos, Cicinho, Mineiro, Josué, Danilo, Júnior, Aloísio, Amoroso, Grafite e Paulo Autuori. Os Heróis do Tri, eternizados para sempre na História.
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Não há palavra melhor que possa exprimir a potência que é o São Paulo FC. Números, todavia, chegam perto. Como é notório, no Brasil, o clube é o maior campeão mundial e maior campeão sulamericano. Também é o maior campeão brasileiro e, desde que nasceu, o maior campeão paulista.
Acostumado a liderar variados rankings, dos mais diferentes critérios e nos mais diversos períodos (quando no topo não surgia, bom motivo havia), chega a parecer arrogância a simples enumeração destes feitos. Não é soberba, é soberania. Como o último grande feito tricolor bem exalta.
Em 2006, Muricy Ramalho retorna ao clube. Craque dos anos 70, auxiliar de Telê nos anos 90 e campeão com o Expressinho em 1994, Muricy vinha determinado a vencer.
Início do ano, Rogério Ceni passa por artroscopia. Do time campeão do mundo, saíram Amoroso e Grafite. No Paulista, o Vice Campeonato, por um ponto. Na Libertadores, mais uma vez eliminamos o Palmeiras, com direito a gol de Rogério (de pênalti), na partida de volta, no Morumbi. Jogos emocionantes contra Estudiantes e Chivas, e chegávamos à nossa sexta final de Libertadores, contra o Internacional de Porto Alegre. Dessa vez, porém, a sorte passou longe do Morumbi, que também se despediu do ídolo uruguaio Diego Lugano, rumo à Turquia.
Ainda abatido pela perda do título, o SPFC empata com o Cruzeiro, em Belo Horizonte. O que seria apenas um bom resultado foi, na verdade, a redenção: o Tricolor perdia por 2x0, quando um pênalti foi marcado em favor do adversário.
Rogééééério! A grande defesa motivou o Capitão, que ainda marcou dois gols, dando ao Tricolor a igualdade no placar. E assim, com a fantástica reação capitaneada por Rogério Ceni, o Tricolor se reergueu rumo ao título.
Foi o passo inicial para a conquista do Tricampeonato Brasileiro (feito inédito e jamais repetido). O primeiro da trinca, esse mesmo de 2006, acabou vindo com absoluta tranqüilidade. De 38 rodadas, o Tricolor liderou 28. Ao assumir a liderança, na 12ª, não a perdeu mais, sendo campeão dos dois turnos da competição.
O título foi decidido com duas rodadas de antecipação, no empate em 1x1 com o Atlético-PR, no Morumbi. Depois de 15 anos, mais uma vez o Tricolor era campeão nacional. Fato natural para o clube que conquistou o Brasil ao menos uma vez em cada década de existência do torneio.
No ano seguinte, guias e revistas especializados não apontavam o SPFC entre os favoritos. Ainda assim, o Tricolor assumiu a ponta da tabela na 17ª rodada, após emocionantes vitórias fora de casa contra Grêmio e Botafogo. Como de praxe, seguiu até o fim em 1º lugar.
O ponto forte da equipe de Muricy era a defesa formada por Breno, Alex Silva, Miranda e, por vezes, André Dias. Com a incrível média de 0,5 gol sofrido por jogo e uma sequência impressionante de 9 jogos sem sofrer gols, o São Paulo foi campeão ao vencer o pequeno América-RN, por 3 a 0, em casa, com incríveis quatro rodadas de antecipação.
A jóia da coroa seria lavrada em 2008. Novamente a crítica especializada não dava crédito à equipe do SPFC, eliminada da Libertadores no último minuto de jogo no Maracanã. Adriano, o Imperador, recuperado para o futebol pelo Tricolor, retornara a Milão. Ao início do 2º turno, após derrota para o Grêmio (líder da competição até então, 11 pontos à frente do Tricolor), a mídia já destacava em letras garrafais: o São Paulo tem 1% de chances de ser campeão!
Era esta a probabilidade de título que apontavam ao SPFC de Muricy Ramalho e companhia. Talvez a motivação que faltava para a arrancada final: uma série de 18 jogos invictos. Em Brasília, ao vencer o Goiás (1x0), o São Paulo se consagrou. 1% Campeão!
O primeiro Tricampeão consecutivo do Campeonato Brasileiro desde sua criação, em 1971. O primeiro Hexacampeão (77/86/91/06/07/08).
Não somente Tri-Hexacampeão Brasileiro. O Tricolor consagrou-se Soberano.
Soberano por suas glórias, que vêm do passado. Soberano por seu futuro, eternamente promissor.



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